Entrevista Joana Reais
Conheça a cantora Joana Reais, uma Amiga da Associação Salvador que leva Portugal até ao Brasil na sua voz!
1 – Em que momento da sua vida decidiu enveredar pela carreira artística?
Ao olhar para trás, reconheço que esse rumo foi tomado bastante nova, de forma inconsciente até. Cresci numa família que sempre incentivou a expressão individual de cada um e a exploração de diversas linguagens artísticas, tais como o Teatro, a Dança, a Pintura, a Fotografia…. Experimentei um pouco de todas e foi sempre na Música que me senti como peixe na água. Desde os 6/7 anos que eu já era a “cantora da família”, mas, claro, a partir do momento em que fui buscar formação específica e passei a dedicar várias horas por dia à minha arte, a decisão ficou clara para todos de que se tratava de uma escolha profissional.
2 – O Brasil foi uma aposta profissional? Sente que encontra aí mais oportunidades?
Sim, sem dúvida. Radiquei-me em São Paulo em finais de 2014 e tanto a nível académico, como a nível profissional e até pessoal, o Brasil apresentou-se como uma escolha óbvia para uma emigração. O mercado é maior, as possibilidades são infinitas, assim como a generosidade dos músicos… A cada dia que passa apaixono-me mais e mais por esta forma de encarar a vida que valoriza muitíssimo o papel do artista na sociedade.
3 – Quais são os pontos mais altos da sua carreira e os próximos desafios e surpresas que podemos esperar?
Um momento do qual tenho imenso orgulho foi o lançamento do meu álbum de estreia: “a Lisboa”, em Janeiro de 2015, que é um cartão de visita ao universo da Joana e resume um percurso por entre as linguagens do jazz e da worldmusic com composições assinadas pelo guitarrista bahiano Múcio Sá. O carinho que recebo, além fronteiras, derivado desse trabalho não pára de me surpreender e emocionar. Mas existem outros momentos, como ter feito acrobacias num smart todo-o-terreno no programa “Salvador”, ter sido entrevistada pelo grande comunicador Herman José a propósito do “a Lisboa” e todas as palestras que dei sob o tema: “A Oportunidade da Adversidade” que me permitiram dialogar com o outro e revelar o potencial de transformação e de crescimento de qualquer evento negativo… Quanto ao futuro, 2017 será o ano em que apresentarei a minha música nos palcos paulistanos, com uma banda de extraordinários músicos e companheiros brasileiros, e quem sabe esta ponte musical entre Portugal e Brasil venha desaguar a terras lusas!
4 – Aos 22 anos sofreu um acidente que com certeza marcou a sua vida. De que forma deixou que esse acontecimento definisse quem é, quais os seus sonhos e as suas ambições?
Pode parecer uma resposta cliché, mas a verdade é que tal nunca me passou pela cabeça. Creio que, para isso, existiram dois factores essenciais: primeiro, o facto de ter sofrido um acidente ferroviário enquanto já tinha uma carreira como cantora que, com a sorte que protege os audazes, me levou membros que não necessito para cantar; em segundo lugar, o ter tido total suporte de uma grande rede de afectos, desde a família, os amigos, os colegas, o próprio pessoal dos Hospitais de São José e de Santo António dos Capuchos − profissionais que ainda hoje, passados 8 anos, me enviam mensagens de orgulho e carinho e que sempre me estimularam a voar mais alto. Sou uma pessoa lutadora e ambiciosa e sentir o apoio de todas estas pessoas foi, e sempre será, motivo da minha maior gratidão. E depois… a vida é curta! Nunca sabemos quando nos trocará as voltas − é preciso aproveitar cada momento e eu tento seguir essa premissa ao máximo!
5 – Já é uma amiga de longa data da Associação Salvador. Qual a sua opinião sobre o trabalho que desenvolvemos?
Tomei conhecimento da Associação Salvador quando recebi um telefonema por parte da produção para ser uma das convidadas do programa “Salvador” (foi uma amiga que me inscreveu, na altura, sem que eu soubesse) − aí conheci o Salvador Mendes de Almeida, a sua associação e todo o trabalho que realizam dentro dos eixos: Conhecimento, Integração Social e Sensibilização dos vários aspectos da deficiência motora na nossa sociedade. Considero de extremo valor o empenho de todos na Associação Salvador, pois é vital para a pessoa portadora de deficiência saber que não está sozinha, que existe uma instituição que a representa e defende os seus direitos, assim como lhe permite realizar actividades no exterior com outros associados, estimulando a inserção social. Só quem passa por uma situação deste tipo sabe o quanto a nossa vida (e a dos que estão à nossa volta) muda do preto para o branco em menos de um segundo e é essencial, não só para o indivíduo como para o colectivo, falar-se sobre o impacto da deficiência no dia-a-dia, desmistificarem-se diferentes preconceitos, realizarem-se actividades para pessoas com e sem deficiência… Enfim, no meu entender, este tipo de obras meritórias são sintomas de uma sociedade saudável e plural.
6 – Gostaria de deixar alguma mensagem para todos os que nos acompanham: amigos, mecenas, beneficiários?
Costumam perguntar-me se, após o acidente traumático que me alterou radicalmente a vida, continuo a mesma. É uma pergunta que dá pano para mangas, pois entendo que, por um lado, é óbvio que não continuo a mesma, visto que me foram amputadas uma perna e parte de um pé, passei meses internada num hospital, fui sujeita a dezenas de cirurgias e, durante mais de um ano, passei por um longo processo de protetização, reconstrução do pé direito e re-aprendizagem da marcha. Por outro lado, mais simbólico, é claro que não mudei, continuo a mesma pessoa alegre, optimista e batalhadora, venci um obstáculo ultra difícil que apenas atesta as minhas capacidades e a generosidade de quem lutou e permaneceu ao meu lado. É esta aparente contradição que eu quero deixar como mensagem: que perante acontecimentos que nos transformam e jamais nos deixarão incólumes, que saibamos fortalecer-nos, transformando-nos em pessoas melhores.
Janeiro 2017
